
Instruções que desanimam

Este texto é do mestre Dzongsar Khyentse Rinpoche e foi extraído do livro Not For Happiness, loc. 254.
Práticas budistas são técnicas que usamos para lidar com nosso auto-acariciamento habitual. Cada uma é projetada para atacar hábitos individuais até que a compulsão de se agarrar a um “eu” seja completamente erradicada. Então, embora uma prática possa parecer budista, se ela reforça o apego a si, na verdade é muito mais perigosa que qualquer prática abertamente não-budista.
O objetivo de um número excessivo de ensinamentos hoje em dia é fazer as pessoas “se sentirem bem”; alguns mestres budistas estão até começando a soar como apóstolos New Age. Suas palestras são inteiramente voltadas para validar as manifestações do ego e apoiar a “nobreza” de nossos sentimentos, coisas que não tem nada a ver com os ensinamentos que encontramos nas instruções essenciais.
Então, se você está preocupado apenas em sentir-se bem, será muito melhor receber uma massagem corporal completa ou ouvir alguma música enaltecedora, ou do tipo “viva a vida!”, do que receber ensinamentos do darma — que definitivamente não foram projetados para te animar. Pelo contrário, o darma foi tramado especificamente para expor suas falhas e fazer você sentir-se horrível.
Experimente ler “As palavras de meu professor perfeito”. Se achar depressivo, se as verdades desconcertantes de Patrul Rinpoche balançarem sua autoconfiança mundana, fique contente. Esse é um sinal de que finalmente você está começando a compreender algo sobre o darma.
Falando nisso, ficar deprimido não é sempre uma coisa ruim. É completamente compreensível alguém ficar deprimido e desanimado quando sua falha mais humilhante é exposta. Quem não se sentiria meio nu em um situação assim? Mas não é melhor estar dolorosamente consciente de uma falha do que totalmente inconsciente dela? Se uma falha em sua personalidade permanece escondida, como você pode fazer qualquer coisa a respeito?
Então, embora instruções essenciais possam temporariamente te deprimir, elas também vão ajudar a desenraizar suas deficiências ao trazê-las para a luz do dia. Isso é o que quer dizer a frase “o darma penetrando em sua mente”, ou como Kongtrul Rinpoche coloca: “a prática do darma dando frutos”, em vez das tais boas experiências que muitos de nós almejamos, como bons sonhos, sensações de bem-aventurança, êxtase, clarividência ou aperfeiçoamento da intuição.
Para Kongtrul Rinpoche, quando um praticante para de achar grande coisa sobre o que costumava dar muito importância o tempo todo, esse é um sinal de que a prática do darma está dando frutos. Por exemplo, antes de se tornar um genuíno praticante, receber um elogio sobre seu cabelo iria te intoxicar de deleite, enquanto a mera sugestão de que ele estava um pouco menos que perfeito imediatamente te jogaria na espiral descendente da depressão.
Nem chegar a reagir em qualquer uma das situações é um sinal de que a prática está dando frutos e que você está se tornando um praticante autêntico do darma, e isso é muito melhor do que ter um milhão de elogios, sonhos encorajadores ou sensações de êxtase.


16 Comentários
Édpo Luis Francisco
Olá eu não sou um praticante de medição, + adoro budismo e os ensinamentos q ele nos ensina e mostra, adorei o texto.
Paulo Alspher
Gasshô! /
Wagner Bione
“Nem chegar a reagir em qualquer uma das situações…” Isso quer dizer que você fica em um estado neutro?
poetinha
No sentido de se comportar da mesma forma, sem apego. Seja um elogio ou crítica e assim por diante.
Josiane P.B
Muita gente confunde se “sentir neutro” com “sentir com atenção”. Certa vez estava conversando com uma colega de curso e ela disse: “Imagine ser que nem um daqueles monges que ficam neutros a tudo? Daí a vida não teria graça.” O Budismo não nos ensina a eliminar nossos sentimentos, e sim a vigiá-los para que não se transformem em apego. Como um professor do dharma já disse para mim “Afinal, nós não somos “esponjas””. Ou seja, praticantes e monges sentirão alegrias e tristezas, mas sempre os vigiarão para que não se deixem influenciar por esses sentimentos e acabar transformando-os em apego.
Victor Gomes
Eu tenho a mesma pergunta Wagner Bione…
Vanessa
Obrigada!
Felipe
Não sou seguidor do Budismo Tibetano, mas sigo o Taoismo e o Budismo Tradicional, e realmente, essa postagem sobre instruções que desanimam é a mais pura realidade, os sentimentos incomodos como: sofrimento, vergonha, sensação de impunidade, cansaço, injustiça, são as unicas coisas eternas no universo, não da para se livrar desses sentimentos, voçê pode apenas tentar se acostumar e não se sentir mal com isso, assim a dor acaba, e alcançamos o nirvana.
Vinicius
Olá Felipe. O seu ponto de vista sobre o nirvana é bem maduro, é sempre bom conhecimento novo. Mas, em debates e em boas conversas com outros amigos meus, um filósofo, e outro psicólogo, chegamos a conclusão de que atingir o nirvana é se desapegar do ego, já que este é o gerador dos sentimentos. O Buddha seria então, um grande poço de compaixão e paciência.
Boa noite. Gasshô
Gerson
Instigante . Nem apego nem aversão . O caminho do meio. Tão fácil e tão difícil quanto a simplicidade .
Gelson Machado
grato.
Eduardo Amorim
Gasshô.
graça
Ou aceitamos com bom ânimo as intruções “desanimadoras” em tempo para corrigi-las em nós mesmos, ou aprenderemos com a vida, que ensina as mesmas coisas na prática.
Leandro
Bem … foi bom saber que a culpa serve pra alguma coisa . Se faço algo e logo em seguida me sinto culpado, é sinal que no meu íntimo , eu não estou de acordo com a decisão que tomei .
Bruno
Ótimo site, ótimos textos, meus parabéns!
Daniela
“Aquele que não se regozija ao conseguir algo agradável nem se lamenta ao obter algo desagradável, que é inteligente em assuntos relacionados ao eu, que não se confunde, e que conhece a ciência de Deus, já está situado na transcendência.” (Bhagavad-gita 5.20)
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